2014/05/07

Há uns anos tive um colega de trabalho com quem, à partida, não tive grande empatia, além de que o achava bruto, conflituoso e com maus modos. Por coincidências, nessa altura conheci um rapaz (gay) que era um dos melhores amigos dele, e que me afiançou que ele era homofóbico. Não me espantou, até porque encaixava no perfil que já havia traçado.
Tempos depois, quis o destino (e o meu chefe) que ele viesse trabalhar para junto de mim. Surpreendentemente foi a mim que ele recorreu para pedir ajuda nas novas tarefas que então lhe eram estranhas; e contrariamente ao esperado começou a haver uma empatia muito grande entre os dois, tendo se construido uma amizade que dura até hoje.

Nessa altura eu fazia natação e ele acabou por se fazer de convidado para me acompanhar nas idas à piscina. Por vezes, ficávamos sentados a olhar para quem nadava, e ele começava a comentar os corpos dos rapazes que por lá andavam. Uma vez comentou que achava graça aos garotos com calças a meio do rabo. Com frequência presenciei conversas dele com o irmão mais novo, via telemóvel, e enternecia-me o registo carinhoso e algo paternalista, que terminava sempre com troca de beijos.

Mas a maior surpresa veio na altura em que ele foi pai de um menino; certo dia ele começou com aquelas conversas que quase todos os homens têm sobre os filhos irem ser uns "garanhões" com as raparigas, mas de repente mudou radicamente de registo e disse:
"... mas se ele for gay, também não há problema; claro que eu prefiro que ele não seja, unicamente por ele, porque se ele for, irá ter uma vida muito mais dificil".

Foi a primeira (e talvez única) vez que ouvi um pai dizer isto de um filho. Esta frase, vinda de alguém que, a dado momento, julguei ser homofóbico, é a prova de que nem sempre as primeiras impressões são as últimas ou as melhores.

Agora raramente falamos, mas é um dos grandes amigos que deixei nas Beiras.
Nem sempre somos o que parecemos, ao som de Father and son (Cat Stevens).

33 comentários:

  1. "Não há uma segunda oportunidade de causar uma primeira boa impressão". Contudo, por vezes há remédio para a má primeira impressão que se cria sobre determinada pessoa. E pelos vistos, esse foi o caso (e ainda bem).

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    1. Nem sempre as pessoas são o que parecem, para o bem e para o mal. Mas eu acredito firmemente nas segundas oportunidades.

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  2. é bom quando nos enganamos assim :)
    quando as pessoas nos mostram o seu melhor lado

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    1. É bom quando descobrimos que os outros são muito para além do que aparentam :)

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  3. esse teu ex-colega teria muito medo do que estaria a sentir. infelizmente, ainda falta muito para a sociedade aceitar a homossexualidade como natural. a começar pelos gays/bi que se estão a enganar a si próprios.
    ele reconheceu, nesse comentário sobre o filho...

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    1. Ele não é nem é gay; mas também não é homofóbico, nem coisa que se pareça. É na verdade um homem muito sensível, muito sensato e sem complexo, e apenas isso.
      há uma nova geração de pais (a nossa, Margarida) que encara a eventual homossexualidade dos filhos com naturalidade.

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    2. Acho que tens razão Sérgio, a homossexualidade já não é um tabu escondido (pelo menos por cá) e as pessoas começam a "aceitar" e a ter os "amigos gay". Que me parece ser o caso de esse teu amigo e isso abre a perspectiva das pessoas...

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    3. Mais importante do que isso; alguns amigos meus, da minha geração, já falam com alguma naturalidade sobre a eventual homossexualidade dos filhos. Essa é que é a grande e importante mudança.

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    4. Sim é, o que eu queria era ilustrar motivos do porquê dessa mudança...

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  4. Ainda bem que estavas enganado em relação á pessoa.
    Foi um engano bom :)

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    1. Foi um ótimo engano.
      Só há que saber dar ou sabere sperar por segundas oportunidades :)

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  5. É nestas pequenas coisas que penso que há esperança.

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    1. Tb creio que há esperança nestas pequenas-grandes coisas :)

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  6. As mudanças de mentalidade também acontecem e ainda bem :D

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  7. Muitas pessoas querem parecer mais duras do que realmente são. Pode ser que se sintam mais seguras sob uma carapaça que não mostre o seu real modo de ser. Por vezes, até pelo modo que foram educados, achem que ser sensível não é algo bom, especialmente para um homem.

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    1. Só revelamos verdadeiramente o que somos perto das pessoas que nos são mais próximas.
      Eu tb sou muito reservado, e exponho-me muito pouco a simples conhecidos. Com os meus amigos sou muito mais eu, e a maioria acaba por se surpreender com isso.
      Mas claro que existe o estereótipodo homem que não pode ser sensível.

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  8. as pessoas nem sempre são o que aparentam ser, o que muitas das vezes pode ser algo positivo (as vezes nem tanto..).
    custa-me acreditar que existam muitas pessoas homofóbicas por aqui pelo no país (das gerações pós 25 de abril) e acredito que muitos falam do que não sabem e mudam logo de opinião assim que começam a conviver com o que inicialmente criticavam (pelos vistos não é o caso do teu amigo).
    é bom ver que as pessoas conseguem sempre surpreender-nos pela positiva :)

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    1. Eu creio que ainda existe muita homofobia por aí, mais ou menos camuflada. Já conheci gays homofóbicos, e da geração pós de abril, e só isso é dramático de mais.
      Mas o giro desta história, é o olhar de um homem acabado de ser pai, sobre a possivel homossexualidade do seu filho.

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  9. As aparências iludem. Acho que já disseram tudo. No entanto, é normal a tua apreensão de início.

    Um pormenor que ninguém focou. Foste vítima dos teus próprios estereótipos ("bruto, conflituoso, maus modos"). Eu também seria. Creio que a maioria. É engraçado quando somos nós a alimentar ideias erróneas baseadas no preconceito. :)

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    1. Não o achei homofóbico à partida, mas de facto, baseado num estereótipo, não me surpreendia nada se ele fosse.
      Mas o mais curioso, é ter sido um amigo dele (que era gay) a alimentar essa ideia, quando isso não correspondia absolutamente nada à verdade.

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  10. Às vezes as pessoas surpreendem-nos.
    Por acaso nunca apanhei nenhum caso assim, as minhas primeiras impressões até costumam ser certeiras não sei porquê, mas é bom qd nos "enganamos" assim :)

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    1. Por vezes não damos uma segunda oportunidade para mudar as primeiras impressões, e nem nos damos conta disso. Mas a vida já me mostrou muitas vezes que as primeiras impressões nem sempre correspondem rigorosamente à verdade.

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    2. Por acaso uma vez disse basicamente isso, que se tivesse um puto gostaria dele de qualquer forma, mas que se fosse hetero era bastante mais simples pra ele , pelo prisma do preconceito e assim e chamaram me de homofóbico e ficaram chocadissimos xD

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    3. Eu sou pai, e penso exatamente assim. Isso não é ser homofóbico...

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  11. O que te digo é que nunca sabemos o que vai na cabeça de outra pessoa e quando julgamos que vêem a vida com outros olhos, afinal são tão tapadas como as que já conhecemos. Mas a sorte é que há sempre as excepções. :-)

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    1. nós próprios tb fazemos juízos com meias impressões. mas temos sempre que acreditar que há excepções :)

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  12. Apesar de eu achar que é muito dificil as pessoas mudarem, acho que elas podem sempre limar algumas arestas. Vai-se a ver foi esse o caso! ;D

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    1. Julgo que não foi ele que mudou; o que mudou foi a forma como passei a olhar para ele, poro conhecer melhor :)

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  13. É curioso que esse teu antigo colega de trabalho, que presumo seja meu conterrâneo, venha com esta história confirmar uma ideia que eu tenho de há muito e que até não abona muito a favor dos beirões, pelo menos de imediato.
    Enquanto os alentejanos e os transmontanos, por exemplo, logo de início mostram com toda a sinceridade o que sentem por ti, os beirões são bastante desconfiados e só depois de saberem bem o "terreno que pisam" se atrevem a serem como na realidade são.
    Esta história poderá demonstrá-lo.

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    1. Ele é efetivamente teu conterrâneo.
      Sinceramente não sei se posso afirmar que os beirões são mais desconfiados que os alentejanos, e até estou em condições, neste momento, de poder fazer esse juizo.
      Eu sou muito desconfiado, e sou muito mais dado quando recebo do que quando sou recebido. Mas a verdade é que fiz bons amigos em ambas as regiões.

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  14. Gostei muito mais desta postura que da outra dos teus amigos.

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    1. Presumo que estejas a falar da história da "lésbica fêmea" :)
      são titudes muito diferentes mas que refletem muito bem aquilo que penso dos beirões (nesta história) e dos alentejanos (na outra).

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