2012/04/28

História #26
Autor: Inês Montenegro (tales of gondwana)

"PORQUÊ QUE CHORAS?"

“Porquê que choras?”
- Porque me dói.
“O quê?”
- Tudo, dói-me tudo!
Os braços curtos rodearam-no, confortando-o no seu choro de menino, livre e inocente, de brincadeiras azaradas.

“Miguel.”
- Que foi?
“Porquê que choras?”
- Não choro.
“Eu conheço-te…”
- Deixa-me.
“Não o posso fazer.”
E ele chorara, blasfemara e insultara… Socara a parede até esfolar os punhos, dando vazão ao turbilhão que a ex-namorada lhe causara quando o traíra. Deixara-se escorregar até ao chão, aceitara o novo abraço, caindo no esquecimento amado que apenas ele lhe proporcionava…

- Entrei!
“Naquele curso!? Porra, parabéns!”
- Dá-me um abraço – rira, nem ele mesmo sabendo se a sério se a brincar. Ele dera-lho, folgado e animado.

“Conseguiste?”
Miguel calou-se, o cenho cerrado, mantendo o mistério. Rafael socou-o ao de leve.
“Conseguiste ou não?”
- Que me dás se tiver conseguido?
“Um abraço.”
- E se não?
“Outro abraço.”
- Só!? Não vale!
“Um beijo. Ficas feliz?”
- Homo.
“Gay.”
- Está bem, está bem. – Um sorriso rasgado, brilhante. – Consegui. – Abriu os braços. – Tenho emprego.

O ramo de margaridas caiu sobre o caixão fechado, precedido pelo primeiro punhado de terra – ambas haviam sido um privilégio (irónico, tão irónico chama-lo assim) da família. Ele era amigo – um eterno amigo para todos os demais. Apenas Rafael sabia o quão mais eles eram.
Agora, apenas Miguel o saberia.
Regressou a casa, a notícia do acidente ainda tão descrente, tão irreal quanto no momento em que a ouvira.
Como desejara por aquele último abraço…

6 comentários:

  1. Gostei da ideia dos pequenos episódios, cada um com seu abraço, a acompanhar a vida do Miguel! Boa!

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  2. A perda de alguém é uma vivência tão avassaladora... ruminamos sobre o que não dissemos, o que não fizemos... mas depois, mais tarde, veremos que sofrer pelo abraço que não se deu é desperdiçar energia. Vale mais relembrar todos os que se trocaram.

    Inês, gostei destas vivências com que nos presenteaste. =)

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  3. Aqueles abraço. Gostei muito da ideia.

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  4. Vim ler cada uma das histórias. Sendo histórias diferentes, todas me deram oportunidade de pensar e, por razões diferentes de todas gostei.
    Aqui fica o meu abraço.

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